quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Vozes silenciosas

Levanto no meu quarto escuro
uma camisola longa cobre meus pés
lágrimas escorregam em meu rosto
inquieta e febril
da minha janela aprecio
uma lua gigante sorrindo para mim
esboço um sorriso nos lábios
fecho os olhos e adormeço
ouço de longe cantigas de ninar
vejo fileiras de berços e bebês
faço a ronda em  vielas e ruas na madrugada
enxergo solitários  pendurados em andaimes
tento subir numa escada estreita
com degraus que chegam no infinito
sucumbo na subida e não consigo descer
acordo assustada, com medo...
Pego minhas fitas coloridas
e começo a tecer...

Corpos afins se aproximam
nos becos dourados das madrugadas
sou tocada...
Anseios e receios são facilitados
comungo na fonte da sensualidade
e me abandono na impermanência.

Facilito, conquisto
tento me reabilitar.

Flores robustas emergem
danço a valsa dos namorados
levito entre carícias
sou apertada e amada.

Me despeço dos lírios brancos sobre as mesas
tomo champagne e me embebedo
solto fúrias armazenadas.

Volto para a cama abastecida
sentindo minha pele amaciada,

atravesso trincheiras
faço uma leitura da solidão
volto para a cama correndo
e adormeço com punhos cerrados

com as unhas cravadas
lábios sangrando
boca amordaçada
repouso no varal da infância

onde tapas, toques e botas
delimitaram meu território do prazer...
 
The end

Vozes mudas

Estátuas de bronze adormecem nos jardins dos esquecidos,
cabeças cortadas submergem no esgoto cheio de lodo,
crianças com vendas nos olhos, retalham filhotes de
[passarinhos,
entre a fome e o frio congelado, brincam de mímica nos
[suores da noite.


Com suas calças rendadas, prostitutas fazem a ronda da
[noite,
em esquinas escuras, postes altivos iluminam o vazio
[ensurdecedor.
sirenes barulhentas ferem o silêncio seco sem aconchego,
ratazanas saem do seu esconderijo, bisbilhotando
    [transeuntes pálidos.


Loucos feridos fogem de hospícios com seus aventais
[compridos
afugentados das alucinações patinam na neve da comoção e
[da dor,
comiserados do destino sofrem atentados do desatino,
árvores descontroladas soçobram nas tempestade de
[pedras,
ventos alucinantes dançam na escuridão chuvosa...
Fúrias engessadas cobrem devaneios inúteis,
possessos se trombam em avenidas escuras,
tenentes sem fardas lamentam o tempo perdido
meninos de rua limpam faróis quebrados, cortantes,

Vozes sem liberdade escoam em ralos fétidos,
amores em vão raspam carnes  sanguinolentas,
gemidos adormecem em calçadas cheias de vômitos,
romances se quebram em bares da esquina...

Pescoços pendurados apodrecem em praças públicas,
vozes esganiçadas ressoam no infinito...
cantos de rouxinóis fracassam em rochedos montanhosos,
restos mortais se misturam com fragmentos de vidas...


The end

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Minhas vísceras e eu

Os intestinos são vísceras, latentes, borbulhantes; 
de onde expulsamos os dogmas e instituições não digeridas... 
evacuamos o fascismo intelectual apregoado, a arrogância, 
quando conseguimos expulsar tudo, 
aí se dá a pura epifania dos sentidos; leveza e imaginação.

 
Ah! Quanta dor, quanto desamor...
Seres! Me acobertem  com o seu amor...
Respiro. Enxergo fantoches adormecidos,
Rasgados, pendurados, retalhados, amortecidos.
Oh! Deus meu! Tira-me dessa comoção! Dessa solidão!

Protege-me lindo coração... estilhaçado, abençoado.
Amo, com pesar,  essa vida estarrecida...
Cambaleante, escorrego entre  feridas  esvaídas...
Sangues borbulhantes escorregam em veias azuladas
Remexendo, arrastando-se em teias encadeadas

Pelotas pretas se transformam  em  secreções purulentas
Ansiando, com angústia, murmúrios de vidas novas, sedentas.
Emoções cansadas desfilam a contragosto
Em intermináveis, desgostos com arrotos,

Irada, como presa remexida desarvorada,
Visito assustada, doentias vísceras internadas.
Busco renovações  na  solidão em contramão
Viro do avesso emoções escuras em desatino
Estremeço com fúrias abaladas em erosão,

Busco em filhotes em seus ninhos,
graciosos amores genuínos.
Elimino espinhos de galhos secos recolhidos,
Furo com pedras cortantes tumores intumescidos!
Destensiono músculos em recantos adormecidos,
tiro véus sombrios de tecidos  entorpecidos...

Piso! Piso na relva selvagem com fúrias  em desatino
Exorcizo! Exorcizo dores fluentes e mudo meu destino,
Salvaguardo risos contidos em recônditos nublados,
Ajoelho no infinito e mesclo tristes cantigas com pesados fardos.
                              
 The  end

Desordem

Camas desarrumadas
Lençóis atirados no chão
Cumpro rituais de uma paixão inexistente
ensaboo meu corpo
saio na rua, nua....
Pego a mão de um desconhecido
vivo num tom desafinado da vida...
Nada me pertence.
Como me apossar da inexistência?
Como mulher recebo presentes masculinos
Não me aposso deles.
Destrepo da árvore com receio de cair.
Despenco....
Com a imagem denegrida caminho na contramão.
Me garanto nos devaneios da escuridão
há luminosidade nela
entro num teatro de marionetes
sorrio constrangida
tento decifrar os hieróglifos do amor
me desumanizo e viro bicho
caio na correnteza da vida ou da emoção
sem uivos, sem gritos, sem berro, sem grunhidos
tudo volta a silenciar...

The end